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Por que existe um Mês da Visibilidade Lésbica?

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Foto: Ferro’s bar – Acervo Folha de S.Paulo

 

* Texto por: Marina Dayrell, participante do Comitê LBTI+ do Núcleo São Paulo/SP do Grupo Mulheres do Brasil, jornalista especializada em Diversidade, Equidade e Inclusão.

 

Você sabia que agosto é considerado o Mês da Visibilidade Lésbica no Brasil? O mês ganhou esse reconhecimento porque foi nele, há muitos anos, que aconteceram dois eventos muito importantes para a comunidade lésbica brasileira.

O primeiro deles é o Dia do Orgulho Lésbico, que é comemorado em 19 de agosto.

Em 1983, havia um bar, no centro de São Paulo, chamado Ferro’s Bar. Durante o dia, o local funcionava como um restaurante e, à noite, o bar era bastante frequentado pela comunidade lésbica.

Muitos movimentos como os coletivos Lésbico-Feminista e o Grupo Ação Lésbica-Feminista (GALF) se reuniam no Ferro’s Bar. O GALF, inclusive, vendia por lá o “ChanacomChana”, uma publicação independente que falava sobre a organização política e pregava a resistência da comunidade lésbica.

Mas, em 1983, as pessoas que administravam o bar decidiram proibir a venda do periódico por lá. Motivadas pela proibição e pelos frequentes episódios de discriminação que sofriam como mulheres lésbicas, as frequentadoras do local decidiram se organizar em protesto.

Foi assim que aconteceu o Levante do Ferro’s Bar, em 19 de agosto de 1983.

Os panfletos distribuídos durante o protesto incentivaram as pessoas a apoiarem a causa e traziam palavras que ficaram bastante marcadas na história LGBTI+:

“Faz de conta que eu sou tratada igualmente como todas as pessoas.

Faz de conta que o restaurante que eu frequento me respeita como eu mereço.

Faz de conta que a sociedade me encara sem preconceito.

Faz de conta até quando?”

Após pressão das manifestantes, que convidaram outras pessoas do movimento LGBTI+ e figuras políticas para participar do ato, a administração do bar voltou atrás e permitiu a venda do “ChanacomChana”.

Esse episódio ficou conhecido na história LGBTI+ como o ‘Stonewall Brasileiro’ e ele comemora 40 anos neste ano de 2023!

Para quem não sabe, a Revolta de Stonewall foi o marco do movimento LGBTI+ contemporâneo, que aconteceu em Nova York, em 1969, quando muitas pessoas LGBTI+ se revoltaram contra a violência e as batidas policiais agressivas que elas sofriam com frequência no bar Stonewall Inn.

No dia 28 de junho daquele ano, gays, lésbicas, transgêneros, travestis, drag queens e outras pessoas da comunidade LGBTI+ revidaram os ataques da polícia. O impacto da manifestação foi tão grande que outros protestos aconteceram nos dias seguintes, em várias partes da cidade. Um ano depois, pessoas LGBTI+ fizeram uma caminhada entre o Stonewall Inn e o Central Park, no que ficou conhecido como a primeira Parada LGBTI+ do mundo.

Agora, voltando para o mês da visibilidade lésbica, temos outra data comemorada no Brasil em agosto: o Dia da Visibilidade Lésbica, celebrado no dia 29.

A data é uma homenagem ao 1º Seminário Nacional de Lésbicas, que aconteceu em 1996, no Rio de Janeiro. Ele foi organizado para que mulheres lésbicas e bissexuais pudessem discutir e propor ações nas políticas públicas e na busca por direitos e dignidade.

Essas datas são muito importantes para homenagear as lésbicas pioneiras e precursoras dos movimentos sociais no Brasil. Nomes como Rosely Roth, Miriam Martinho, Marisa Fernandes e Alice Oliveira são algumas das muitas mulheres que lutaram (e ainda lutam!) por equidade no país.

Mas essas celebrações também são uma forma de reforçar a luta por direitos das pessoas lésbicas no Brasil. Afinal de contas, muita coisa mudou nos últimos 40 anos, mas as lésbicas brasileiras ainda estão distantes da equidade.

Essas foram as principais conquistas do movimento LGBTI+, no Brasil, nos últimos 40 anos:

  • 1985: O Brasil foi um dos pioneiros em retirar a homossexualidade do rol de doenças. A OMS só tomou essa decisão em 1990 e, para a transexualidade, só em 2019.
  • 1995: Primeira parada LGBTI+ no RJ, e, em 1997, em SP.
  • 2008: Direito à cirurgia de redesignação sexual pelo SUS para mulheres trans, e, em 2013, para homens trans.
  • 2011: União civil para pessoas do mesmo gênero.
  • 2013: Reconhecimento do casamento civil.
  • 2015: Reconhecimento do direito à adoção sem restrição de idade e gênero.
  • 2017: Direito à mudança de nome civil e social sem necessidade de cirurgia.
  • 2019: Criminalização da homofobia e da transfobia.
  • 2020: Fim da proibição à doação de sangue por homens gays, bissexuais, mulheres trans e travestis.
  • 2023: STF determina que atos de homofobia e transfobia contra pessoas sejam punidos como injúria racial.

Essa linha do tempo nos ajuda a ver que houve avanços e conquistas, mas, em relação às pessoas LGBTI+, principalmente às mulheres lésbicas, o que prevalece ainda é a ausência de direitos básicos. Muitos deles vieram muito tarde ou ainda nem vieram.

Outro ponto importante é que a maior parte dessas conquistas foram feitas por decisões do Supremo Tribunal Federal (STF), ou seja, ainda não estão escritas em pedra, já que não foram para a Constituição Brasileira. Elas são uma garantia e devem ser respeitadas, mas enquanto não virarem leis, as suas bases são frágeis.

Por isso, ainda é importante que exista um Mês da Visibilidade Lésbica. Mas que a gente saiba que a luta pela equidade precisa continuar acontecendo em todos os outros dias do ano. Como diriam os panfletos distribuídos no Ferro’s Bar: “Faz de conta até quando?”.

 

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