Cultura São Paulo

Leitura que inclui e transforma

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O brasileiro ainda lê muito pouco. Dados da pesquisa Retratos da Leitura no Brasil, realizada pelo Instituto Pró-Livro (2016) apontam que apenas 56% da população brasileira acima dos cinco anos de idade se enquadram como leitores regulares. Isso significa que leem, pelo menos, partes de um livro a cada três meses. O estudo aponta ainda que o índice de leitura per capita é de 4,96 títulos por ano. Porém se desconsiderarmos os livros didáticos, esse número cai para apenas 2,9 livros ao ano.

Segundo Luciana Burr, participante e voluntária do Comitê de Cultura do Grupo Mulheres do Brasil, os professores são os maiores responsáveis e influenciadores por despertar o prazer pela leitura. “Portanto, se quisermos chegar aos jovens, temos que apoiar os professores a ampliar a experiência da leitura, algo mais na horizontalidade do que de cima para baixo”, afirma Luciana.

E foi com o intuito de incentivar o hábito de leitura em comunidades e com alunos de rede pública, principalmente de escolas do ensino fundamental, que as voluntárias criaram o projeto Clube de Leitura nas Escolas, há dois anos, em parceria com a Fundação para o Desenvolvimento da Educação (FDE) e com algumas escolas.

Desde então, cerca de quarenta mulheres do grupo participam de projetos de leitura, desenvolvendo clubes de leitura e diálogos mediados em escolas, com professores e coordenadores, sempre contemplando a bibliodiversidade, levando livros clássicos, contemporâneos e diversos gêneros literários.  A curadoria dos livros e textos é feita por Janine Durand e Luciana Gerbovic, líderes do Comitê de Cultura.

O Comitê de Cultura do Grupo Mulheres do Brasil tem como propósito reunir mulheres que entendem a cultura como um direito humano fundamental. “Esta dimensão nos permite ler a nós mesmas, a realidade e a transformá-la. E quando fazemos isso coletivamente amplia nossos olhares e possibilita uma experiência de alteridade, empatia, cidadania e transformação social”, diz  Janine Durand.

Para Luciana Gerbovic, a experiência transforma a leitura em uma atividade prazerosa e divertida, sem a preocupação de se estar lendo certo ou errado. “Em um clube de leitura opiniões diferentes são colocadas, com muito respeito pela visão do outro, o que também amplia o diálogo, tão importante para uma sociedade que se quer democrática”, afirma.

Há alguns meses, as voluntárias estenderam o olhar para além das escolas e resolveram levar o clube de leitura a outros públicos. O resultado aconteceu semana passada, dia 11 de abril, na Estação da Luz, em São Paulo, quando iniciaram a leitura do livro Olhos D’Água, de Conceição Evaristo, conduzida por Luciana Gerbovic, juntamente com 20 homens em situação de rua, acolhidos pelo programa Atende 1, da Prefeitura Municipal.

“Foi uma experiência impactante. Todos estavam muito interessados em participar ativamente. Tivemos momentos de leitura, de troca, de opiniões e interpretações maravilhosas, em que os homens presentes puderam contar um pouco a história de suas famílias e filhos”, conta Luciana Burr, que também participou da mediação ao lado de Alice Alves e Luciana Gerbovic.

Leitura de Olhos D’Água na Estação da Luz – Foto: Divulgação

Agora, os encontros serão mensais. “Emprestamos um livro por mês em bom estado, para que leiam e cuidem. Isso, além de incentivar o hábito da leitura, aumenta a autoestima dos participantes, eles passam a ter outra relação com a leitura”, diz Luciana Burr.

Para Luciana Gerbovic, só com cultura e educação é possível diminuir a violência no país. Em uma analogia ao título da obra, relata: “Eu li Conceição Evaristo para eles, atentos, acompanhando a leitura. E a discussão depois, a sensibilidade transbordando, de gente que sabe ler além das linhas… os olhos d’água eram os meus no final”.

“A leitura nos humaniza, pois, na medida em que acessamos locais, pessoas e culturas, nos deslocamos a partir desta experiência repleta de sentidos. Alcançamos, por meio dos clubes, de diálogos amplos e abertos o sentimento do outro, e assim reconstruímos narrativas, construímos pontes e a possibilidade de uma sociedade em que cada pessoa importa”, conclui Janine Durand.

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